Por Thaís Zschieschang
Doutora e mestre em Psicologia Social (PUC/SP), cientista política e internacionalista, com mais de 10 anos de atuação em Desenvolvimento Sustentável, Inovação e Participação Política. Cofundadora do Delibera Brasil e coordenadora de Ativismo Digital do Elo Digital Nacional. Consultora em planejamento, gestão e sustentabilidade financeira de organismos sociais e negócios de impacto, com histórico de atuação no Akatu, Pacto pela Democracia, Direitos Já, PNUD, ENAP, ADE SAMPA, MobiLab+, Hub+ e ADUS.
Mistificação, descrença e criminalização da política: o que são esses três fatores de afastamento político e como podemos enfrentá-los?
O que esses três grandes fatores têm em comum? São formas estratégicas, conscientes e inconscientes, de afastamento político.
O desejo participativo nasce da compreensão das agendas socioambientais e políticas que nos envolvem, da própria estrutura política, e no crédito que damos às instituições pelo bom funcionamento, com uma visão propositiva de que podemos receber mudanças e ser agentes das transformações sociais que desejamos e almejamos como nossa visão de futuro.
A crença nas próprias instituições e no nosso poder de transformar o contexto social são o primeiro passo para a vontade participativa, que se nutre de acessos como oportunidades reais de participação para além das eleições e do voto direto, enfrentamento dos custos participativos como tempo logístico e exposição de perfil para trabalhar com essas agendas de interesse público.
A mistificação da política tem base em seus códigos, estrutura de linguagem, ritos, formalidades e o próprio perfil de pessoas que ocupam cadeiras públicas, sejam elas políticas ou não, mas na frente de lideranças das principais pautas sociais, ambientais e estruturais brasileiras.
Com os ritos, formatos e perfis tradicionais da política, pessoas que não tiveram acesso anterior a como ela funciona se sentem não pertencentes por não entender o seu formato e também que o espaço pode ser considerado muito difícil de ser ocupado ou inacessível.
A mistificação traz a falta de desconhecimento das especificidades como estratégia de exclusão política.
Ao não conhecer os códigos e não se identificar como um perfil que tradicionalmente ocupa esses espaços, você não sente que eles podem ser inclusivos, representativos, refeitos, reestruturados ou reformulados.
Essa é uma lógica de manutenção de poder existente na mão de grupos políticos tradicionais, o que é um equívoco tanto por questões representativas da própria população brasileira quanto de qualidade política por falta de diversidade representativa e ainda assim é uma ferramenta de opressão e exclusão.
É possível enfrentar a mistificação com:
- educação cívica e política;
- ações de centralização das informações;
- transparência em formato acessível;
- adoção de linguagem simples
- e visibilidade de perfis diversos que ocupam lugares de relevância na política institucional e não institucionalizada.
A descrença política se baseia na visão equivocada ancorada nas lideranças políticas e nas instituições públicas.
Na lógica da descrença, diferente da mistificação, o descrédito político é o seu formato, ambiente e lógica funcional. Ou seja, não importa qual seja a instituição política ou pública ou a liderança que ocupa esses cargos, ela é erroneamente prevista como negativa.
A estrutura organizacional, tida falsamente como incompetente por parte da população, é percebida como despreparada. Em outras causas, pelo comparativo entre a lógica de funcionamento do setor privado e do público, visto como obsoleto e ineficiente pela incompreensão de sua complexidade e estrutura.
A transparência das instituições, sua prestação de contas e atuação de órgãos de controle – públicos e sociais -, são formas de resgatar a crença nas repartições e seus agentes, o que deve ser feito de forma conjunta a uma melhoria nos serviços públicos disponíveis e na qualidade representativa para que a percepção de bons fazeres inunde a população brasileira em tal ponto que as falsas crenças de incapacidade serão ressignificadas.
Linguagens simples, campanhas de comunicação e mudanças reais percebidas na prática e no dia a dia das pessoas são as principais catalisadoras dessa mudança de percepção e do próprio desejo participativo.
A criminalização da política é impulsionada pela crença de que quem ocupar tais espaços têm más intenções ou será corrompido por ele.
Entre os principais argumentos, é defendido que os interesses individuais prevalecem aos interesses coletivos por parte das lideranças e que as instituições têm suas funções e propósitos desvirtuados.
A estratégia que pode ser associada a esse desafio é a vitrine de lideranças e premiações, como diversas que já acontecem no ambiente público, mas que podem ser melhor difundidas nos ambientes sociais e privados sobre boas práticas, casos de sucesso e perfis diversos de pessoas públicas e políticas que estão tomando a frente de diversas agendas de interesse coletivo de forma exemplar, permitindo que essas lideranças sejam sempre humanas, passíveis a erros e responsáveis por melhorar sempre.
Enfrentar esses fatores de afastamento político requer um esforço coletivo e contínuo para construir uma sociedade mais informada, engajada e representativa. A educação cívica e a transparência são pilares fundamentais para desmistificar a política, resgatar a confiança nas instituições e humanizar as lideranças. Além disso, é crucial promover uma cultura de participação ativa, onde todos se sintam parte do processo de transformação social.
Ao reconhecer e combater a mistificação, a descrença e a criminalização da política, podemos criar um ambiente mais inclusivo e democrático. Isso não apenas fortalece as instituições, mas também empodera os cidadãos a se envolverem ativamente na construção de um futuro mais justo e sustentável.
Acreditar na política e em nosso papel como agentes de mudança é essencial para alcançar as transformações que desejamos para nossa sociedade.
A aposta é criar um ambiente mais convidativo para escolhas eleitorais mais responsáveis e para impulsionamento da participação política institucional e não institucional para além dos períodos eleitorais.
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