Por Mônica Francisco
Feminista negra, favelada, cientista social, pastora, militante dos direitos humanos, da economia solidária e cria do Borel. A deputada estadual que mais aprovou leis entre as mandatas negras do Brasil. Pesquisadora do Dicionário de Favelas Marielle Franco/Fiocruz. Pré-candidata à vereadora do Rio de Janeiro pelo PT (Partido dos Trabalhadores)
Por que ainda falamos do dia 13 de Maio?
Não existe razão para celebrar. Há, sim, motivos para lembrar. Sonho com o dia em que 13 de maio seja ensinado nas escolas como o Dia da Falsa Abolição. O Dia em que a princesa se autointitulou redentora dos negros.
Em um país forjado sob as égides do trabalho forçado, construído por corpos negros e em cima deles, permeado por torturas, abusos e mortes e que, ainda assim, subjulga as pessoas negras em trabalhos precarizados, a regiões sem saneamento, à fome e à morte pelo Estado.
Em um Brasil de dimensões continentais, de 400 anos de crimes contra povos sequestrados, contra africanos arrancados de suas terras, de políticas de acumulação de riquezas e de desigualdade racial como projeto, a comemoração do Dia 13 de Maio é mais um tapa na cara de nós, negras e negros. O Brasil é estruturado por políticas racistas e injustas, do poder econômico-social ao político.
As sequelas da escravidão se manifestam de forma óbvia na segregação racial, na violência policial e na pobreza concentrada nas comunidades negras.
Portanto, celebrar o dia 13 de maio como um triunfo da liberdade é ignorar a realidade complexa e dolorosa que se seguiu à abolição inconclusa.
Em um artigo de 2020 para o Estadão, trouxe duas histórias, que são representativas do povo brasileiro. Tereza contava para as filhas como era a infância dela, em Campos: Nunca soube a idade certa que tinha. A certidão foi arranjada quando casou, com uma data que a mãe de Tereza dizia, mas a mãe de Tereza ora falava uma coisa, ora outra, confusa com a própria história, confusão natural de quem nasceu escravizada. Tereza nasceu livre, mas não totalmente livre: sem perspectiva, trabalhavam nos canaviais. Lembra que, menina, a comida era pouca. Os livros nenhum.
Quase não tinha comida, imagina ter livros, estes eram para privilegiados como a maioria das coisas. Morava nas terras dos patrões, que tinham sido os donos da mãe. Tereza saiu de lá. Teve as filhas, que foram domésticas. Uma chegou a trabalhar para um bisneto dos donos da terra, senhores de engenho.
Rodrigo reside entre as duas maiores cidades do país. Ele é o herdeiro de um império empresarial baseado na produção de cana-de-açúcar no interior do Rio. Filho de uma família tradicional, dessas que são conhecidas por toda a cidade. Rodrigo foi educado em dois idiomas e passa parte do ano na Europa.
Ele é contra políticas de reparação para negros, afirmando que todas as pessoas são iguais e que o sucesso é alcançado mediante esforço próprio.
Ele apenas enfatiza os esforços que os outros precisam fazer. No entanto, Rodrigo não compreende o verdadeiro significado da palavra que tão livremente utiliza, “esforço”, pois ele nunca precisou realizar nenhum. Ele nasceu em uma vida construída sobre o sofrimento de muitas pessoas que foram arrancadas de suas famílias e pátrias, escravizadas para garantir a riqueza e renome de muitas gerações de famílias como a sua.
Rodrigo faz parte de uma geração privilegiada, que menospreza os que necessitam de políticas sociais do Estado e defende que essas mesmas pessoas retornem às suas condições de trabalho precárias, apenas para enriquecer famílias como a sua.
Porém, Rodrigo, existe uma ligação intrínseca entre a abolição incompleta, quando as pessoas foram deixadas à própria sorte sem qualquer reparação, e aqueles que aguardam o Bolsa Família para garantir a sobrevivência de uma família inteira. Observe atentamente e perceba que são, em sua maioria, pessoas negras.
Treze de maio não é para ser celebrado. É apenas mais um dia para não esquecer a exploração do trabalho escravo.
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