A trajetória de Cris Monteiro
Os principais desafios enfrentados pela vereadora
A QTR teve o prazer de receber Cris Monteiro, vereadora na Câmara Municipal de São Paulo. Ela compartilha parte da sua trajetória pessoal e profissional, até chegar o momento da sua primeira eleição, em 2020. Cris traz pontos importantes ao relatar os principais desafios atuais na vida política e parlamentar.
A trajetória de Cris Monteiro
[…] eu nasci numa família de baixa renda, minha mãe era empregada doméstica, meu pai taxista, então as condições eram bastante adversas. Mas, para piorar um pouquinho as circunstâncias, logo pequenininha, por volta de talvez três, quatro anos, eu desenvolvi uma doença autoimune, onde o meu sistema imunológico acredita que a raiz dos meus cabelos é inimiga do meu corpo. Isso gerou uma complexidade muito grande para a minha família.
Cris Monteiro – Estou com 62 anos, você imagina numa periferia há 58, 57 anos, sem os recursos que a gente tem hoje. Então, naquela época, as crianças brincavam nas ruas, não tinha toda essa diversão, essa distração que a gente tem para as crianças hoje, televisão, iPad, iPhone, e eu não ia para as ruas porque as crianças faziam bullying comigo. Então, eu ficava dentro de casa. O que se faz com uma criança que fica dentro de casa sem as distrações que hoje a gente conhece?
Cris Monteiro – Meu pai, apesar de taxista, era um homem muito afeito às letras, à leitura, era um cara interessado, curioso. Então, ele me dava muitos livros para ler, gibi, me fazia fazer o dever de casa, uma vez, duas vezes, três vezes..
Cris Monteiro- Então, ele me dava muitos livros para ler, gibi, me fazia fazer o dever de casa, uma vez, duas vezes, três vezes. Isso foi transformador na minha vida, porque eu estudei mais do que as outras crianças, infelizmente brinquei menos, e fez com que eu ficasse uma criança muito estudiosa, obviamente, muito observadora, muito disciplinada, e eu levei isso para a minha vida.
Cris Monteiro – Meu primeiro emprego foi de recepcionista, depois eu resolvi fazer faculdade, porque eu queria sair do lugar que eu morava, que era um lugar longe, pobre, muito mais difícil, e entrei em um banco. Então, a história é muito longa, porque tem aí mais de 35 anos de vida profissional, mas essa história é muito longa, curta.
Eu, de recepcionista, acabei virando diretora do maior banco de investimentos americano, o JP Morgan, Eu falo inglês, falo espanhol, tive acesso à arte, cultura, saúde, viajei, li muito mais, conheci muitas pessoas que contribuíram. Para a minha trajetória. E assim foi a vida. Eu nunca tive nenhum interesse por política, nenhum. Eu era a típica leitora, como vários, talvez, de pessoas com quem a gente pode estar falando agora nesse momento, que no caminho das urnas é que eu decidia em quem votar.
– conta Cris Monteiro na entrevista.
Cris Monteiro – […] em 2017, 2016, acho que o cenário político do Brasil ficou extremamente complexo e de alguma coisa despertou um interesse em mim. E desse interesse que foi despertado, eu acabei ficando tão interessada, com tanto desejo de contribuir para a mudança do país, que resolvi pedir demissão do banco que eu trabalhava, esse maior banco de investimentos americano, para me candidatar a deputada estadual.
E eu não fui eleita. Foi uma coisa muito frustrante para mim. Eu me juntei ao Partido Novo, que foi um partido que realmente chegou trazendo uma série de novidades para a cena política brasileira. Ainda estou no Partido Novo hoje, mas, enfim, não fui eleita, mas eu tentei de novo em 2020, em 2020 fui bem-sucedida, estou aqui falando com vocês como uma vereadora da Câmara Municipal de São Paulo, a maior câmara da América Latina
Sobre os ciclos da vida
Sobre os caminhos que percorreu, relata os momentos difíceis da sua trajetória: cada vez em que ela fracassava, sofria muito. Achava que não ia funcionar, não ia dar certo, e tinha um desejo de mudar completamente.
Cris Monteiro – E eu costumo dizer que eu ainda sou um rascunho de mim mesma. Eu ainda não sei o que está por vir. e, quando olho para trás, vejo… Eu costumo falar, uma coisa que poucos falam, eu estou considerada uma pessoa bem-sucedida, virei diretora de banco, essa história idealizada sobre as pessoas que saem da peria e que conseguem conquistar um lugar ao sol. Tem muita idealização sobre isso.
Cris Monteiro – É óbvio que houve muito esforço da minha parte, mas acho que a própria circunstância da Lopes de Ariadna me permitiu, se eu não tivesse alopécia, eu não teria ficado dentro de casa estudando tanto. Então, há circunstâncias que propiciam esses saltos. Então, não gosto de falar da minha história, não gosto que ela seja idealizada, porque senão os jovens da periferia que se esforçam e não conseguem tentem fracassados, e não é essa a mensagem que eu quero passar.
A despeito de todas as perdas que a vida traz para a gente, e não é só para mim, eu tenho certeza, Vivi, Igor e quem está assistindo vão viver, se já não viveram, situações muito difíceis, mas a despeito dessas situações difíceis, Vale a pena seguir, porque essa vida que a gente tem, e fazer dela o melhor é como se fosse uma… Não é uma missão, porque eu não quero ter essa imagem de que tenho uma missão, não sou muito desse tipo, mas vale a pena prosseguir, porque dias melhores virão, dias ruins virão, e vai ser assim ao longo de toda a linha da nossa vida. Acho que vale a pena.
Sua primeira disputa eleitoral
Ao decidir se dedicar exclusivamente à política, pensou em desistir após a primeira derrota nas urnas. No entanto, assim como o reconhecimento, o fracasso também ensinou muitas lições.
Cris Monteiro – Eu pensei em desistir, porque não é tão óbvio assim. É como acho que o Igor falou, quando você vê a história para trás, Você fala, poxa, ela não venceu em 2018, ela venceu em 2020, ela não desistiu. Não, eu pensei em desistir, fiquei muito frustrada. Eu pedi demissão de um lugar onde eu tinha… Eu era diretora, eu vivia viajando, eu tinha remuneração, prestígio, poder, enfim. E aí foi muito frustrante não ter sido… Eu entreguei muito na eleição de 2018, Então, eu não ter sido eleita foi um fracasso. Então, o resultado não é para mim, eu vou desistir, vou pensar na minha vida.
Eu entreguei muito na eleição de 2018, Então, eu não ter sido eleita foi um fracasso. Então, o resultado não é para mim, eu vou desistir, vou pensar na minha vida. ocê pode dizer assim, não, eu poderia fazer uma história para você. Não, eu não desisti, insisti, fui lá e venci. Não foi bem assim. No primeiro momento, eu falei, tudo bem, fiquei muito triste, fracassei, não quero mais, mas à medida em que, talvez seja uma característica pessoal, à medida em que vou digerindo aquilo, vou entendendo o que aconteceu, vou tentar mais uma vez.
Cris Monteiro – Uma pessoa comum que fracassa, que tenta de novo e que poderia ter fracassado de novo. Espero não ter muitos mais fracassos no futuro, mas, pelo que a vida tem mostrado, algumas outras coisas vão acontecer na minha vida. Eu vou perder coisas […]. Enfim, é assim. Então, eu acho que depois eu acordei da frustração e falei, deixa eu tentar mais uma vez. Eu estava mais preparada, porque eu já. Tinha feito 2020, então eu aprendi muito com o fracasso.
O papel de liderar
Cris Monteiro – Olha, quando você está numa posição de poder, é muito importante que você saiba liderar. Então, é delícia, uma das delícias é que as pessoas te reconhecem, muitas pessoas reconhecem, não todas as pessoas, falam que legal que você fez esse trabalho. Eu faço muita terapia, e ontem mesmo, na minha sessão de terapia, a gente estava falando sobre isso, porque você tem que muito controlar o seu ego, porque tem muita gente que fala que você é maravilhosa, que é incrível o trabalho que você fez, isso te incha, te infla, mas é muito importante que eu me resgate sempre. Por quê? Porque as ofensas também virão. Então, se eu acreditar muito nos elogios, eu imediatamente vou acreditar muito nas ofertas, então eu vou ficar lá em cima e lá embaixo, lá em cima e lá embaixo, numa gangorra emocional.
Cris Monteiro – Então, preciso reconhecer o trabalho que faço, de forma muito dedicada, e essa posição de poder te coloca exatamente no jardim das delícias, nesse lugar onde você só quer receber elogios. E se você não conseguir fazer esse resgate, é um jardim de miséria, porque as ofensas virão. Tem gente que não vai gostar bem, tem gente que não vai gostar da forma como eu lidero. É uma responsabilidade. Acho que também essa é uma resposta que eu quero dar para você, Igor, Vivi, e para quem nos está ouvindo.
É muito importante a gente entender a responsabilidade de estar no lugar do poder, de atuar e caminhar no lugar. Eu quero passar uma mensagem. Que mensagem é essa que eu quero passar? É uma mensagem de retidão, de honestidade, de trabalho, Então, eu preciso ser honesta, trabalhadora, preciso ser correta, porque tem que liderar por exemplo. Eu falar alguma coisa e fazer outra, aquilo não vai, não encaixa. Então, há que ser muito responsável.
– conta Cris Monteiro na entrevista.
Sobre seu mandato
Segundo a vereadora, seu mandato é fundamentalmente pautado por entender os problemas que existem e como pode resolvê-los.
Cris Monteiro – Chegou nas minhas mãos, logo no primeiro ano de mandato, uma pesquisa dizendo que a gestão escolar ajuda muito no desempenho dos alunos. Também chegou à minha mão pesquisa sobre uma escola charter, esse é um nome que complica um pouco, mas a gente pode dizer que é uma escola veneada, ou seja, são escolas públicas, municipais, porém geridas por organizações sociais lucrativas. Há o mesmo exemplo de como a gente tem nas creches, Hoje as creches são públicas, o pai e a mãe não pagam nada para a sua criança, mas a gestão dessas creches são feitas, a gestão é feita, perdão, por organizações sociais sem fins educativos. É o mesmo modelo, é ter gestão privada.
Cris Monteiro – Você imagina, por exemplo, uma mulher na periferia, uma família na periferia, que pode ter a gestão daquela escola, de uma das melhores escolas de São Paulo, por seguro, bandeirantes, quem não vai querer? Então, essas escolas, esse é o processo de lei, que é ter a gestão da escola municipal, a escola continua gratuita, sem custo para as famílias, nada muda, inclusive o plano da educação é o mesmo, segue o… Enfim, a base nacional curricular não muda nada, é apenas a gestão escolar. Acontece que fui muito criticada. Criticada é baixo, criticada é pouco, aliás.
O projeto de lei para a educação básica e seus desafios
Cris conta ao QTR que há uma grande resistência em relação às Charter Schools, projeto de lei focado na melhoria da gestão da educação básica. O projeto é de sua autoria e está em tramitação na Câmara Municipal de São Paulo. Em meio a essa dificuldade política, a vereadora comenta ainda outros problemas: de intolerância política até ofensas à sua condição física.
Cris Monteiro – Fui muito agredida por pessoas que querem manter as escolas no mesmo nível que estão. Então, é uma ideia revolucionária, uma ideia que pode, de fato, e tem se mostrado que funciona nos Estados Unidos, na Inglaterra, no Chile, na Colômbia, vários países adotam. A gente sabe que jovens e crianças não educados vão ser adultos que não vão ter pensamento crítico, vão ter adultos que não vão conseguir desafiar a mim mesma, desafiar a minha, desafiar a sociedade e refletir sobre a vida que estão vivendo.
Então, eu sofri muito, muito, muito, muito, foi muito difícil para mim Mas aprendi, como falei antes, que a vida vai ser feita de elogios e críticas. Infelizmente, as críticas não são só críticas construtivas, não são críticas às ideias, mas são críticas à minha pessoa, não são críticas à minha ideia, são críticas à opinião, são críticas à minha característica física, ao fato de eu ser careca. Então, foi muito difícil, mas estou aqui, estou firme.
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Cris Monteiro – Nem toda a rede precisa ser no modelo das escolas conveniadas, a gente pode fazer algumas escolas, principalmente na periferia, onde, infelizmente, o nível de aprendizado é ainda mais baixo, considerando as características do entorno.
Cris Monteiro – Então, fui muito criticada, muito ofendida, inclusive, por um grupo de pessoas que querem manter a educação do jeito que está.
Cris Monteiro – O projeto está tramitando na Câmara Municipal, e eu tenho esperança de que a gente vai conseguir convencer as pessoas e a sociedade de que é um bom projeto que vai melhorar a qualidade do ensino nas nossas escolas.
Recado para os ouvintes e leitores
A política transforma as nossas vidas, o nosso entorno, a rua que a gente anda, a nossa educação, a nossa saúde. E a gente precisa muito, mas muito, que a sociedade civil se aproxime, nos cobre, que venha pedir para a gente o que vocês estão fazendo. Não se afastem da política. Não sei se o conselho poderia dar para as pessoas. Se quiser ser político, ótimo, se quiser ser assessor, ajudar na campanha de alguém. Agora, em 2024, a gente vai ter eleição para prefeito e vereadores, escolhe uma pessoa, procure ajudar, se aproxime de alguém que fale mais ou menos aquilo com que você se alinhe e colabore.
– conta Cris Monteiro na entrevista.