A Trajetória de Eduardo Suplicy - Parte 2
Renda básica: sua origem, história e desenvolvimento
Durante sua entrevista ao QTRCast, o Deputado Estadual e ex-Senador Eduardo Suplicy dedicou um momento especial para explicar sobre a proposta de Renda Básica de Cidadania. Além de compartilhar com riqueza de detalhes a história que dá respaldo a tal política pública, o representante nos conta um pouco mais sobre si e sobre seus sonhos.
Eduardo Suplicy sugeriu ao presidente Lula a criação de um grupo de trabalho para estudar a implementação da Renda Básica de Cidadania, conforme previsto na Lei 10.835 de 2004 e na Lei 14.601 de 2023.
Ele perguntou ao Ygor e à Viviane durante a entrevista se eles recebiam a Renda Básica, já que desde 2004 temos a Lei aprovada afirmando que: “Art. 1º É instituída, a partir de 2005, a renda básica de cidadania, que se constituirá no direito de todos os brasileiros residentes no País e estrangeiros residentes há pelo menos 5 (cinco) anos no Brasil, não importando sua condição socioeconômica, receberem, anualmente, um benefício monetário.”
Ygor e Viviane afirmaram que não (assim como você, leitor provavelmente também não recebe ou sequer sabia deste direito). Eduardo Suplicy, então, explica:
Eduardo Suplicy – Não recebem, mas poderão vir a receber em breve. Por que razão? Eu tenho sugerido, enviei uma carta ao presidente Lula, em outubro passado, sugerindo a ele que organizasse um grupo de trabalho que pudesse estudar os passos previstos tanto na lei 10.835 8 de janeiro de 2004, como também na lei 14.601 de junho de 2023, que (…) reinstituiu o programa Bolsa Família e define o programa Bolsa Família como um passo na gradual implementação da universalização da renda básica de cidadania.
É direito de toda e qualquer pessoa, não importa sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou socioeconômica, de participarmos todos da riqueza comum de nossa nação, através de uma renda que, na medida do possível, com o progresso do país, será suficiente para atender às necessidades vitais de cada pessoa. A ninguém será negado. nem para o Ygor, nem para a Vivi, nem para o mais bem-sucedido empresário de São Paulo e do Brasil, para a Xuxa, para o Pelé, se fosse vivo. Sim, todos vamos receber. Só que aqueles que temos maior riqueza e renda, vamos colaborar para que nós próprios e todos os demais venham a receber.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Vantagens da Renda Básica de Cidadania
Eduardo Suplicy destaca as vantagens da Renda Básica de Cidadania, mencionando a eliminação da burocracia, vergonha e dependência. Ele argumenta que a renda básica incentiva o progresso ao invés da ociosidade, ressaltando a importância da liberdade e dignidade humana, conforme Amartya Sen diz em seus escritos.
Eduardo Suplicy – E daí vem as grandes vantagens da Renda Básica de Cidadania, que estão muito bem colocadas, tanto no meu livro Renda de Cidadania, como também neste livro Renda Básica uma proposta radical para uma sociedade livre, uma economia sã, (…) uma obra dos professores Filipe Ivan Párez e Yannick Van der Bort.
Eduardo Suplicy – Primeiro, eliminamos toda e qualquer burocracia envolvida em se ter que saber quanto cada um ganha no mercado formal, isto é, na carteira de trabalho assinada, ou em qualquer atividade que façamos. Por exemplo, se uma mãe toma conta das crianças da vizinha, e recebe um trocado no dia seguinte, não precisa declarar. Eliminamos também o sentimento de vergonha ou com respeito a, “ah, eu tenho preocupação de precisar dizer que eu só ganho tanto e por isso mereço tal complemento de renda”. Acaba com esse problema. Eliminamos também o chamado fenômeno da dependência que acontece quando tem um sistema que diz quem não recebe até certo patamar tem o direito de receber tal complemento e a pessoa está por decidir, “vou ou não iniciar essa atividade que vai me render esse tanto, mas se eu iniciar e receber esse tanto e aí vem o governo e me retira o que eu estava recebendo”.
Naquele programa eu talvez desisto e entre na armadilha da pobreza ou do desemprego, mas se todos iniciarmos da renda básica em diante, sempre haverá o estímulo ao progresso. Será mesmo? Será que não vai estimular a ociosidade? Pensemos um pouco em nós, seres humanos. Todos nós amamos realizar uma série de atividades, mesmo sem remuneração no mercado. As mães, quando estão amamentando seus bebês, qualquer hora da noite, do dia, da madrugada, com todo carinho e amor, nas associações de bairros, nas igrejas de todas as denominações, nos centros e diretórios acadêmicos, quantos de nós não organizamos tantas tarefas porque nos sentimos úteis perante a comunidade? É uma questão de bom senso. Mas qual é a principal vantagem da renda básica incondicional universal?
Eduardo Suplicy – A vantagem final é justamente do ponto de vista da dignidade e da liberdade do ser humano, da qual nos fala Amartya Sen em “Desenvolvimento como Liberdade”, onde ele diz que desenvolvimento, se for para valer, deve significar maior grau de liberdade para todos na sociedade.
Algumas histórias sobre a falta de liberdade
Uma freira o convidou para o Parque da Luz, onde conversou com prostitutas preocupadas com suas situações. Ele observou que muitas recorriam à prostituição por falta de recursos para suas famílias. Suplicy também destacou o caso de jovens que entram para o crime por necessidade financeira. Ele argumenta que a renda básica proporcionaria dignidade e liberdade, permitindo escolhas mais autônomas para essas pessoas.
Eduardo Suplicy – Ora, certo dia, veio me visitar uma freira de uma ordem italiana, acho que criada no século 18 ou 19, para, sobretudo, estar cuidando das prostitutas. E ela me convidou para que eu fosse visitar o Parque da Luz, onde, na casa de chá do Parque da Luz, conversei com ela, com dezenas delas, que estavam preocupadas com diversas situações. E eu notei que, muitas vezes, uma mãe não tendo como dar de comer em casa para suas crianças, resolve se prostituir lá no Parque da Luz. Também todos nós conhecemos aquilo que os Racionais, meu amigo Mano Brown, coloca com tanta clareza nas suas canções: aquele rapaz que não tendo como auxiliar no orçamento da sua família, resolve se tornar um aviãozinho da quadrilha de narcotraficantes como o personagem do homem na estrada.
Eduardo Suplicy – Conhecem o homem na estrada que recomeça a sua vida, a sua dignidade, a sua liberdade que foi perdida, subtraída, quer mostrar a si mesmo que realmente mudou, que se recuperou, quer viver em paz e dizer ao crime nunca mais? O dia que houver, para si, cada membro da sua família, para este rapaz, para aquela mãe, uma renda suficiente para sofrer as suas necessidades vitais, esta pessoa vai ganhar o direito de dizer “não, agora eu não preciso aceitar essa única alternativa que me surge pela frente, mas que vai ferir a minha dignidade, colocar minha saúde e vida em risco, agora eu vou poder aguardar um tempo, quem sabe fazer um curso aqui na minha cidade, numa instituição, com o professor Ygor Leal e com a professora Viviane Freitas, até que surja uma oportunidade, mas de acordo com a minha vocação, com a minha vontade.”
Eduardo Suplicy – É neste sentido, pois, que a renda básica de cidadania vai elevar o grau de dignidade e liberdade real para todos.
E é por isso que eu batalho tanto por esta proposição. E agora, tendo havido a concordância em audiência com o presidente Lula de ser formado aquele grupo de trabalho, na última quinta-feira houve uma primeira reunião, havia 44 pessoas, 17 presencialmente e 27 plataformas virtual, online, e nós tivemos a primeira reunião, que durou cerca de três horas e meia, para pensar em como passar do programa Bolsa Família gradualmente para a Renda Básica Universal.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Um lugar especial para o Eduardo Suplicy
Eduardo Suplicy – Quando o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, anunciar como é que será a transição do programa Bolsa Família para a Renda Básica Universal, ele poderá fazer isso num lugar especial como o salão onde ele normalmente promulga as novas leis, onde ele sanciona as leis, ou, no caso, bastará não possivelmente uma nova lei, mas uma regulamentação da lei que institui a renda básica de cidadania, porque ela, por lei, já existe.
Eduardo Suplicy – Em 21 de abril de 2021, o consenso de todos os ministros do Supremo Tribunal Federal, eles determinaram que o poder executivo, o governo federal, (…) precisava regulamentar a lei que significava a instituição da renda básica universal, e justamente agora, pela lei que eu mencionei, 14.601, o Bolsa Família vai se tornar gradualmente a renda básica universal e incondicional para todos os brasileiros, e diz a lei, até para os estrangeiros aqui residentes há cinco anos ou mais. Mas um lugar que eu gosto muito de frequentar, agradável, é o Parque Ibirapuera, aqui em São Paulo.
A renda básica ao longo da história
Suplicy menciona diversos pensadores ao longo da história que abordaram a importância da justiça social e da renda básica. Desde Confúcio até filósofos como Aristóteles, Thomas More, Thomas Paine e Karl Marx, todos reconheceram a necessidade de garantir a sobrevivência das pessoas. Esses ideais foram propagados por figuras como Bertrand Russell e até mesmo economistas modernos como Milton Friedman, Paul Simonson e Friedrich Hayek, defendendo a renda mínima como uma solução para os problemas sociais.
Quinhentos e vinte anos antes de Cristo, o mestre Confúcio, no Livro das Explicações e das Respostas, observa que a incerteza é ainda pior do que a pobreza. E pode alguém sair de casa senão pela porta? O nome do meu livro é “Renda de Cidadania: a saída é pela porta”, justamente para lembrar que se trata de uma solução de bom senso.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Eduardo Suplicy – Se formos um pouco mais adiante na história e encontrarmos com Aristóteles, 300 anos antes de Cristo, em “Política”, diz que a política é a ciência de como alcançar o bem comum, uma vida justa para todos. Para isso, se faz necessário a justiça política, que precisa ser precedida da justiça distributiva, que torna mais iguais aos desiguais.
Eduardo Suplicy – Se nós formos ver o Antigo Testamento da Bíblia Sagrada, qual é a palavra mais citada, 513 vezes? Me ensinou o Rabino Henry Sobel, tsedhakah, que em hebraico significa justiça social, justiça na sociedade, que era o grande anseio do povo judeu, como é do povo palestino. Se nós formos ver o Novo Testamento, nos Atos dos Apóstolos está que eles venderam todos os seus bens, passaram a viver em comunidade, de tal maneira a prover a cada um de acordo com as suas necessidades.
Eduardo Suplicy – Se formos ver as parábolas de Jesus, como as do Senhor da Vinha, ele diz que o Senhor da Vinha contratou inúmeros trabalhadores ao longo da jornada. Na primeira, na segunda, até a última hora do dia. Com cada um, combinou o que ambos consideravam justo (…) Começou o pagamento pelo último que ali chegava. E quando pagou o primeiro, este lhe perguntou “mas como assim? O Senhor está me pagando o mesmo que ao último que aqui chegou e eu trabalhei mais do que ele”, “ora, você não percebe que eu estou lhe pagando o que ambos consideramos como justo e que o último que aqui chegou também precisa receber o necessário para o sustento da sua família?”
Eduardo Suplicy – Se formos olhar a segunda epístola de São Paulo aos Coríntios, ele diz que todos nós devemos sempre seguir o exemplo de Jesus que, em sendo tão poderoso, resolveu se solidarizar e viver dentre os mais pobres, de tal maneira que, conforme está escrito, para que haja justiça, para que haja igualdade, toda aquela pessoa que teve uma safra abundante não tenha de mais, toda aquela pessoa que teve uma safra pequena não tenha de menos.
Eduardo Suplicy – Se formos olhar os ensinamentos dos seguidores de Maomé, do islamismo, no livro dos Hadith, o Omar, o segundo deles, diz que toda aquela pessoa que detém um grande patrimônio deve destinar uma parcela desse patrimônio para os que pouco ou nada têm.
Aliás, em “Uma ética para o novo milênio”, Dalai Lama, que é do budismo, diz que se for para aceitar o consumo tão suntuoso dos mais ricos, nós precisamos antes assegurar a sobrevivência da humanidade. Podemos seguir um pouco mais adiante na história e nos depararmos com Thomas More.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Thomas More, autor de A Utopia, em 1516, no livro primeiro de A Utopia, há um diálogo em que o cardeal Morton está conversando com diversas personagens sobre a pena de morte que, instituída na Inglaterra no início do século XVI, não havia colaborado para diminuir a criminalidade violenta. E eis que, então, o viajante português Rafael Hitlodeu — “Hitlodeu”, em grego, é um contador de histórias — observa “muito mais eficaz do que infligir estes castigos horríveis — aqui não tem outra alternativa senão de primeiro tornar-se um ladrão para daí ser transformado em cadáver — é você assegurar a sobrevivência das pessoas”. E com base nesta reflexão, um amigo de Thomas More chamado Juan Luis Vives, espanhol, escreveu para o prefeito da cidade flamenga de Bruges, na Bélgica, um tratado de subvenção aos pobres, onde pela primeira vez propõe a garantia de rendimento para os habitantes de Bruges.
Eduardo Suplicy – Por essa razão, Thomas More é considerado um dos grandes pensadores da história, que fundamentou muito bem o direito à renda básica. Podemos seguir mais adiante, encontrarmos com Thomas Paine, o grande ideólogo das revoluções americana e francesa, nascido em 1743. Mais tarde tornou-se amigo de Benjamin Franklin, aquele que inventou o para-raios. Antes só se usava monóculo, ele inventou os óculos. E ele persuadiu Thomas Paine a ir viver na América antes da independência e para lá ele foi como um contador, como um cobrador de impostos e arguto observador de costumes e de valores, que passou a escrever ensaios que tiveram enorme impacto na mente dos americanos para que eles proclamassem a sua independência.
Eduardo Suplicy – O livro foi lançado em janeiro de 1776 e seis meses depois, em 4 de julho, os americanos proclamaram a sua independência. O que dizia Thomas Paine em “Senso Comum”? Contraria o bom senso que uma ilha domine um continente e coisas como tais. Acontece que ele, Thomas Paine, começou a se sentir muito perseguido por suas ideias tão ousadas e resolveu voltar para a Inglaterra. Lá chegando, imagine o que aconteceu. Começaram a queimar os seus livros.
Eduardo Suplicy – E então ele seguiu para a França, onde embora estrangeiro, foi eleito constituinte francês três anos após a Revolução Francesa e, como tal, em 1795, ele escreveu um ensaio chamado Justiça Agrária, que está publicado no meu livro “Renda de Cidadania: A Saída pela Porta”. Ele diz que a pobreza é algo que tem a ver com a civilização e a instituição da propriedade privada (…) era o seu plano, e esse para todos os países, que toda pessoa que assim pudesse ter o rendimento do seu trabalho na sua propriedade, deveria destinar uma parcela do rendimento para um fundo que a todos pertenceria, e deste fundo, uma vez acumulado, se pagaria a cada pessoa tanto um capital básico como uma renda básica, como um direito inalienável de todas as pessoas participarem da riqueza comum da nação.
Eduardo Suplicy – Se formos um pouco mais adiante na história, no século XIX, Karl Marx escreveu a crítica escreveu o Manifesto Comunista junto com Friedrich Engels. Mais tarde, os volumes de O Capital. E mais tarde, em 1875, (…) ele diz que numa sociedade mais amadurecida, os seres humanos vão se portar de tal maneira a poderem escrever como lema da sua sociedade, de cada um de acordo com a sua capacidade, a cada um de acordo com as suas necessidades.
Certo dia, eu estava fazendo uma palestra para as comunidades eclesiais de base lá na Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, então presidida pelo Dom Luciano Mendes de Almeida, saudoso defensor dos direitos humanos. E eu fui explicando as coisas que eu estou lhes falando, e quando, ao final da palestra, ele disse a mim “Eduardo, você não precisa citar o Karl Marx para defender a sua proposta, que ela é muito melhor defendida por São Paulo na Segunda Epístola aos Coríntios”, (…) eu então li a segunda epístola de São Paulo aos Coríntios, onde ele diz que todos devemos sempre seguir o exemplo de Jesus, que em sendo tão poderoso resolveu viver dentre os mais pobres e muito solidário a eles.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Eduardo Suplicy – E de tal maneira que, para que haja igualdade, para que haja justiça, toda aquela pessoa que teve uma safra abundante não tenha de mais, toda aquela pessoa que teve uma safra pequena não tenha de menos. E eu achei tão bela a epístola de São Paulo aos Coríntios que eu sempre cito tanto São Paulo quanto Karl Marx como o embasamento da renda básica de cidadania.
Eduardo Suplicy – Se formos ao século XX, em 1918, o grande filósofo Bertrand Russell, em “Os Caminhos para a Liberdade”, onde ele faz uma reflexão sobre o socialismo, o fascismo, o sindicalismo, os movimentos que abalaram a Europa antes da Primeira Grande Guerra Mundial, ele chega à seguinte conclusão, depois de analisar todos esses planos, “o que eu defendo é que cada pessoa deve ter o necessário para a sua sobrevivência, e daí para frente cada um vai conseguir aquilo que obtiver por seu talento, esforço, capacidade, produtividade, mas a ninguém deve ser negado o mínimo para a sua sobrevivência.”
Eduardo Suplicy – E daí para frente, mais e mais, na América, na Europa, economistas, filósofos e tudo, no mais largo espectro, desde Milton Friedman a Paul Simonson, a James Tobin, John Kenneth Galbraith e Friedrich Hayek, passaram a defender a garantia de uma renda mínima, seja através do imposto de renda negativo, como foi na minha primeira proposta, ou mais e mais da Renda Básica Universal, que eu vim a estudar mais, e fiquei persuadido de que ela será a melhor solução para resolver os problemas.
Eduardo Suplicy – Qual o chefe de estado que, num livro recente, chamado “Vamos Sonhar Juntos: O Caminho para um Futuro Melhor”, defendeu a renda básica? O Papa Francisco, autor de “Vamos Sonhar Juntos”, que eu recomendo a vocês, disse reconhecer o valor do trabalho não remunerado para a sociedade, vital para repensarmos o mundo pós-pandemia. Por isso, acredito que seja hora de explorar conceitos como o da renda básica universal.
A renda básica universal poderia redefinir as relações no mercado laboral, garantindo às pessoas a dignidade de rejeitar condições de trabalho que as aprisionam na pobreza. Daria aos indivíduos a segurança básica de que precisam, eliminando o estigma do seguro-desemprego, e facilitaria a mudança de um trabalho para outro, como cada vez mais os imperativos tecnológicos do mundo trabalhista exigem. Políticas como essa também podem ajudar as pessoas a combinar tempo delicado a trabalho remunerado com tempo para a comunidade.
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Experiências da renda básica no Brasil e no mundo
Suplicy menciona dois lugares que adotaram sistemas de renda básica: Maricá e o estado do Alasca. Em Maricá, o programa começou em 2016, proporcionando renda extra às famílias, enquanto no Alasca, um fundo com parte dos royalties do petróleo garante uma renda anual para os habitantes. Além disso, ele destaca o exemplo de Macau, que implementou um esquema de participação na riqueza para seus habitantes permanentes.
Maricá começou gradualmente por iniciativa do então prefeito Washington Quaquá, que em 2015, em dezembro, ouviu uma palestra minha sobre a renda básica e ele falou, eu quero aplicar em Maricá. E começou com 10 mumbucas ou reais por mês para cada família que recebe o Bolsa Família, em janeiro de 2016, janeiro de 2017, 20 mumbucas ou reais por mês para cada família que recebia o Bolsa Família. Em dezembro de 2019, Todas as pessoas que estavam em famílias que ganhavam até três salários mínimos, passaram a receber primeiro 130, depois 170, depois 200 mumbucas ou reais por mês.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Eduardo Suplicy – Em novembro passado, a prefeitura, agora o prefeito é o Fabiano Horta, (…) anunciou que metade da população da cidade, cerca de 93 mil habitantes, passaram a receber 230 mumbucas ou reais por mês e os efeitos têm sido muito positivos e Maricá está sendo observado inclusive em análises de órgãos internacionais, como Jain Family Institute, em parceria com estudos da Universidade Federal Fluminense.
Eduardo Suplicy – Então Maricá é um dos lugares que você vai visitar. O outro (…) é o estado do Alasca. Nos anos 60, o prefeito de uma pequena vila de pescadores chamada Bristol Bay, observou que de lá saiu uma grande riqueza na forma da pesca, mas boa parte da população continuava pobre. Ele disse aos seus concidadãos “vamos criar um imposto de 3% sobre o valor da pesca para instituir um fundo que a todos pertencerá”.
Eduardo Suplicy – Demorou cinco anos para ele persuadir a comunidade. Uma vez instituída, deu tão certo que dez anos depois, Jay Hammond foi eleito governador do estado do Alasca, lá ao norte dos Estados Unidos, junto ao Canadá. E aconteceu que o Alasca (…) ao norte do Alasca, nos anos 70, encontrou enorme reserva petrolífera. Então disse o governador Jay Hammond aos seus então 300 mil habitantes, que hoje são mais de 730 mil, “nós precisamos pensar não apenas na geração presente, mas na vindoura, porque o petróleo, como outros recursos naturais, não é renovável.”
Eduardo Suplicy – “Vamos separar pelo menos 25% dos royalties decorrentes da exploração dos recursos naturais para instituir um fundo que a todos pertencerá.” E ele quis que todos debatessem e votassem. 76 mil disseram sim, 38 mil não, dois para um, venceu, então aqueles recursos passaram a ser investidos no Fundo Permanente do Alaska em títulos de renda fixa. Ações de empresas do Alaska contribuindo para diversificar a sua economia, dos internacionais, inclusive do Brasil, como Petrobras, Bradesco, Itaú, Vale do Rio Doce, Banco do Brasil e 200 empresas brasileiras, e ainda empreendimentos imobiliários. E o fundo evoluiu de 1 bilhão de dólares no início dos anos 80 para hoje cerca de 80 bilhões de dólares.
Eduardo Suplicy – Caso você estivesse residindo no Alasca, então, entre 1º de janeiro e 31 de março, você ia lá, desde que residindo um ano ou mais, teria preenchido um formulário, uma página só. Eu (…) resido em tal endereço, se viajei no ano passado, por tal, qual motivo, estou aqui de volta. Responde por suas crianças até 18 anos. Por elas você recebe igual para cada uma. Trabalho em tal organização. Não precisa dizer qual a sua remuneração, nem o seu patrimônio acumulado. Poucas perguntas adicionais. Duas pessoas que lhe conhecem testemunham que essa declaração é verdadeira.
Quem assim procedeu no final de setembro ou começo de outubro por transferência eletrônica na sua conta bancária ou, se preferiu, por cheque enviado à sua residência, você lá teria recebido nos primeiros anos 80, primeiro 300, depois 400, 500, em 2022 foram mais de 3.200 dólares por pessoa para os 732 mil habitantes do Alasca. Qual foi a consequência? Alasca, 1980, o mais desigual dos 50 estados norte-americanos. Hoje, Alasca junto com Utah são os dois estados mais igualitários dos Estados Unidos e constitui suicídio político para qualquer liderança propor o fim deste sistema.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.
Eduardo Suplicy – Então, você vai primeiro à Maricá, depois ao Alasca, e depois você pode ir a Macau. Macau, ex-colônia chinesa, ex-colônia portuguesa, que voltou a pertencer à República Popular da China, mas que autorizou que lá fosse um sistema político diferente da República Popular da China. Eles ali autorizaram a existência de cassinos que tiveram enorme desenvolvimento.
Eduardo Suplicy – Em 2006 houve forte tensão social em Macau e então eles resolveram criar o Wealth Partaking Scheme, um sistema de participação da riqueza para os cerca de 700 mil habitantes permanentes de Macau, que foi evoluindo em 4 mil patacas, 5 mil, 6 mil, desde 2008, Vem crescendo, hoje está em mais de 10 mil patacas, mais de US$ 1.500 por pessoa, por ano, numa família de quatro. São US$ 6 mil por ano. Já tem três lugares para você fazer a sua reportagem e estudo.
Uma mensagem para os ouvintes e leitores
Eduardo Suplicy menciona que a justiça na sociedade pode ser alcançada através de medidas como educação de qualidade para todos, melhor atenção à saúde, promoção da economia solidária e formas de transferência de renda, como o Bolsa Família. Ele defende a implementação da renda básica universal como uma medida fundamental para promover justiça social e paz. O deputado expressa sua crença na importância dessa proposta e espera ver sua aplicação no Brasil e em todo o mundo.
O Papa Francisco, quando ele fez a última viagem pela América Latina, teve um momento que ele disse que já estava voltando (…) colocar em prática aqueles instrumentos de política econômica que possam elevar o grau de justiça na sociedade, para que então possa haver a paz dentro de cada país e dentre os países. O que pode elevar o grau de justiça? Foi abolida a escravidão, elevamos o grau de justiça, mas não tomamos todas as medidas para compensar mais de 300 anos de escravidão. Se nós proporcionarmos a melhor qualidade de educação para todos os meninos e meninas, todas as crianças, para os adultos, para os adultos que não tiveram boas oportunidades quando eram crianças, para os jovens, se possível, em tempo integral, estaremos elevando o grau de justiça.
Eduardo Suplicy – Se proporcionarmos uma melhor qualidade de atenção à saúde na cidade, no campo e em todos os bairros das cidades, também. Se promovermos mais e mais a economia solidária, as formas cooperativas de produção, também vamos contribuir para uma sociedade mais solidária. Também, se à luz dos ensinamentos de Muhammad Yunus, criador do Banco do Vilarejo, em Bangladesh, que proporcionou, eu estive lá visitando, oportunidades formidáveis, inclusive para as mulheres poderem adquirir instrumentos de trabalho que lhes permitiam viver com melhor qualidade de vida e ainda pagaram o microcrédito, e daí temos as formas de transferência de renda.
Eduardo Suplicy – No Brasil, o benefício da prestação continuada, o seguro-desemprego, o salário-família e o bolsa família, mas todos estes podem ser unificados e racionalizados na direção proporcionarmos a renda básica universal e incondicional para todos.
Então, eu acredito muito nessa proposta, tenho tentado conversar com Deus e com os orixás para me darem a boa saúde, para ver ainda durante a minha vida a aplicação da renda básica no Brasil e, se possível, nas Américas, em todo o planeta Terra, pois eu avalio que será um passo muito importante para a humanidade, conforme o Papa Francisco escreveu.
– conta Eduardo Suplicy na entrevista.