O que é Advocacy: Possibilidades da política brasileira

Andréa Gozetto e Arthur Mello debatem o papel do advocacy na política brasileira

A QTR recebeu, em um entrevista animadora, dois profissionais que construíram suas trajetórias atreladas ao advocacy e à representação na política brasileira. Convidamos Andréa Gozetto, coordenadora na FGV e professora de Relações Institucionais e Governamentais (RIG), e Arthur Mello, coordenador de advocacy no Pacto pela Democracia. Os dois somaram forças para debater sobre o funcionamento das instituições e a importância da defesa direta e indireta de interesses no contexto da democracia brasileira.

Qual a relação entre Advocacy e Lobby?

Andréa Gozetto discute as nuances entre esses dois temas. Ela aponta a percepção negativa associada ao lobby no Brasil, enfatizando que, embora advocacy seja frequentemente visto como mobilização e engajamento público, também envolve articulação política direta. Segundo ela, a atual crise na representação eleitoral revela a necessidade de participação contínua dos cidadãos no processo decisório para fortalecer a democracia.
Andréa aponta que práticas como advocacy e lobby podem ser incorporadas para facilitar o processo de representação de interesses da sociedade civil.

Nós somos seres humanos que carregam pré-noções. Então, toda vez que nós vamos falar de lobby, a gente já vem carregado com toda essa bagagem de que lobby é corrupção e tráfico de influência. 

Bom, quando a gente vai para a literatura internacional, to advocate, que é defender, é o todo. E o lobby é a tática. 

[…] O termo advocacy é muito associado também a engajamento e mobilização, única e exclusivamente. Mas essa prática é bem mais abrangente que isso. Poque toda vez que a gente ouve uma campanha de advocacy, logo se vê a perspectiva da comunicação daquela campanha, mas tem uma perspectiva de articulação política, também do advocacy. 

– Afirma Andréa Gozetto em entrevista.

Participação popular e advocacy

A professora e coordenadora, explora a crise global no sistema representativo e destaca que as táticas de lobby e estratégias advocacy se sobrepõem à representação eleitoral no Brasil pós-Constituição de 1988. Ela argumenta que o aumento do interesse pelo Advocacy, sobretudo por parte das organizações da sociedade civil indica a crise da representação eleitoral, o que leva os cidadãos a se engajarem mais nas decisões governamentais indiretamente.

[…] você tem uma pegada forte de participação popular em toda a Constituição. Há conselhos gestores, conselhos nacionais de políticas públicas, audiências e consultas públicas e etc. Muito bem e, tudo isso vai se sobrepondo à representação eleitoral. Lobby e Advocacy referem-se à representação não eleitoral e ela se sobrepõe a representação eleitoral.

– Afirma a entrevistada

Andréa Gozetto Advocacy

Mesmo defendendo a importância dessas práticas, a professora destaca a necessidade e valorização que se deve ter diante do envolvimento da sociedade civil nas tomadas de decisões.

Andréa Todo cidadão precisa acompanhar as decisões governamentais. Porque, principalmente no Brasil, que a gente tem um déficit de ação coletiva […] E a cultura política, infelizmente, tem uma baixa intensidade, o que acontece? As pessoas se apartam da política, e a democracia é a participação do processo decisórioNão é só votar nas eleições. O momento das eleições é o momento em que você delega seu poder. É só isso. Não tem outra função. A eleição é um momento de delegação. Mas quando é que você exerce a sua cidadania?

O que advocacy significa na prática?

A Quem te Representa? pediu ao Arthur para contar mais sobre como funcionaram ações concretas de advocacy que ele conduziu. O entrevistado então contou sobre ações do Pacto pela Democracia desde a estratégia até o resultado.

Lobby é contato direto e o advocacy é o contato indireto. Quando que eu faço advocacy? Quando eu não tenho acesso aos tomadores decisões […] Por isso precisamos engajar e mobilizar a sociedade civil, para que a sociedade civil pressione o tomador de decisão […] eu não tenho acesso a esse tomador de decisão, mas antes disso, eu preciso ganhar legitimidade e representatividade.

 Afirma Andréa na entrevista.

Arthur Mello usa de exemplo a PEC 9/2023, mais conhecida como PEC da Anistia. Proposta de Emenda à Constituição que concede anistia a partidos políticos que não cumpriram as cotas mínimas de destinação de recursos em razão de sexo ou raça nas eleições de 2022. 

Junto com o Pacto pela Democracia, coalização com centenas de organizações que lutam pela defesa e fortalecimento da democracia no Brasil, ele formou uma das principais frentes para barrar a PEC.

O Pacto é uma coalizão de mais de 200 organizações da sociedade civil em defesa do Estado Democrático de Direito. Então, a gente tem cumprido essa função aqui com muitos atores diferentes e tem sido cada vez mais interessante ver a sociedade civil presente nos corredores de Brasília, presente dentro dos ministérios e fazendo essa mistura interessante de relações institucionais, com advocacy, com ativismo, pura e simplesmente, e todas essas técnicas para tentar mobilizar a sociedade e conduzir a política pública do país para um lugar que a gente acredita que seja mais interessante.”

Spoiler: ” e a gente consegue barrar tanto a mini reforma eleitoral, quanto a PEC 09, quanto o avanço do novo Código Eleitoral” – conta Arthur.

Se você quer saber mais detalhes sobre essa história e sobre os desafios e delícias de trabalhar com advocacy no Brasil, não pode deixar de conferir o episódio completo.

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E o que a gente fez? O governo tem um conselho de participação, que é o chamado Conselhão. (Pensamos) “Vamos atrás dos conselheiros para ver se os conselheiros do governo são a favor disso?”
Aí a gente conseguiu cerca de 50 conselheiros que publicaram uma carta falando que eram contra. E aí com isso a gente já conseguiu chamar um pouco de atenção. Depois a gente chamou todos os movimentos de transparência, porque era um ataque à transparência eleitoral, transparência partidária.
A gente ia por dois lugares. Um que era conversar com os deputados, principalmente o relator e o presidente da Comissão Especial e, por outro lado, trazer um embate público mesmo. Então, ir lá com militantes do movimento negro, por exemplo, que foram com cartazes e com as bocas tapadas com fita isolante para falar por que querem calar nossa voz na política, etc.

Não deixe de ouvir a entrevista na íntegra! Basta apertar o play lá no início ou acessar o episódio no Spotify.

Uma mensagem dos convidados

A gente precisa jamais perder de vista o nosso pragmatismo, sem cair no cinismo. […] Acho que quem ouve o Quem te Representa está nesse ambiente de construção política através de propósito. Tem a parte de ideal, com certeza, mas tem a parte de propósito. E o propósito necessita do pragmatismo, mas quando a gente se perde no cinismo, a gente larga do propósito e vai para o… qualquer coisa que der, vale. E não é isso que a gente quer.  

Arthur Mello

Eu acho que a gente precisa desmistificar o que é ter contato direto com o poder. Não é o poder que corrompe as pessoas. O poder só potencializa o que você já é. É a mesma coisa do dinheiro. […] Eu acho que é muito importante também a gente se conectar mais. Porque, afinal de contas, as decisões governamentais impactam a nossa vida cotidianamente, da hora que você levanta até a hora que você vai dormir. Define até qual que é a qualidade do seu sono. 

É muito importante que a gente entenda esse impacto das decisões governamentais e entenda também que você pode, sim, você não pode, você deve, é seu direito levar a sua opinião até o tomador de decisão. Não porque você delegou o poder a ele, que você perdeu o seu poder. o povo continua sendo soberano aqui nesse país.

Andréa Gozetto

Se quiser conhecer mais sobre o Pacto pela Democracia, do Arthur, e da Andréa, confira a entrevista completa no Spotify.

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